Passeio noturno
II
Saiu do carcere
e imediatamente
deixou gravida a sua mulher;
A pega pelo braço
E a noite passeia pelo bairro.
A barriga da dama quase chega até o
nariz.
Ela leva com graça essa carga sagrada.
Você se sente altivo e orgulhoso.
Está fresco.
Esse frescor que tem os bebes
Quando as mãos se esfriam
Você quis apertá-la em seus braços
para manté-las quente.
Pela porta do açougue
rondam todos os gatos deste bairro
e a mulher encaracolada, a do segundo andar,
suas tentas se instalaram
na janela, sobre o parapeito
e ela contempla a noite.
O céu está muito limpo, iluminada apenas,
e no meio se vê a estrela do pastor
que centelha como um copo d’água.
O verãozinho de São João deste ano
se prolongou muito
se as amoras se tornem amarelas
verdes ainda se mostram as figueiras.
O tipografo Rafik
com a filha de Yorguí, do leiteiro,
vagabundeia no crepúsculo
seus dedos se entrelaçam.
Em seu armazém as lâmpadas acendem
Karabef
O cidadão armênio não perdoou nunca
que seu pai fora degolado
na montanha kurda
Mas te ama
porque sabe que você também não o perdôo
aqueles marcados com essa mancha negra
na frente de seu povo,
o povo turco.
Os tísicos do bairro
os que estão amarrados ao seu leito
olham por trás dos vidros
O filho sem trabalho de Hurí a lavadeira
a tristeza pendurada dos ombros
vai café
A radio de Istambul difunde as notícias do último
momento
de um país muito distante além da Ásia distante.
Os cara-amarela-igual-a lua
estão brigando contra um dragão branco
Até ali foi enviada as pessoas de seu povo
São quatro mil e quinhentos exemplares
de Memet,
destinados
a assassinar seus irmãos
Enrubesce o rosto
de vergonha e de cólera.
Uma tristeza
Uma tristeza que não é nada abstrata
Uma tristeza que o pertence
Uma tristeza atada pelos pés e mãos
como se sua mulher atropelassem
jogando-a ao chão
e a fazendo perder seu bebe,
ou ainda, como se estivesse ainda na prisão com policiais de origem camponesa,
e os presos camponeses o espancassem.
A noite caiu repentinamente.
O passeio noturno terminou
Um carro policial aparece na esquina da sua rua
e sua mulher sussurra:
Não será por nós?
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